OBRIGADO, MEU FILHO!


  
OBRIGADO, MEU FILHO!
(Ariovaldo Cavarzan)

Meu filho,
Em mais este segundo domingo de agosto, quero fazer uma nova caminhada com você, para juntos curtirmos o sol e conversarmos mais um pouco acerca da soberana circunstância de termos sido escolhidos por Deus para desempenharmos nesta vida os papéis de filho e pai.
Sabe meu filho, nunca me incomodou o fato de você não ser capaz de fazer algumas coisas sozinho, porque, com isso, me concede a oportunidade de ajudá-lo a complementar aquilo que não consegue, e isso para mim é quase nada, porque você sabe fazer praticamente tudo sozinho.
Além de caminhar junto com você, sempre que posso curto também nossas saídas a dois para um passeio de carro, ouvindo aquela sua música preferida e com o ar condicionado ligado.
A vida inteira senti muito orgulho de ter você ao meu lado,
concedendo-me a oportunidade de fazê-lo meu companheiro,
assessor e ajudante, sempre que possível.
Adoro quando chega a sexta feira e você me lembra que é dia de levá-lo àquela lanchonete, aqui perto de casa, ou aquele dia incerto da semana, escolhido por você para comemorarmos qualquer coisa,
na mesma pizzaria de sempre.
O dia do recebimento da mesada, então, é sempre o mais esperado,
ainda mais agora que o acréscimo de novas e pequenas
tarefas caseiras lhe garante uns quebrados a mais,
para engordar seus caraminguás ajuntados.
Não me importo que você não conseguiu
aprender a ler e a escrever como outras pessoas.
Afinal, infelizmente vivemos num país pouco afeito à cultura e à formação
de consciências voltadas para os deveres da cidadania e da dignidade.
Então, por que exigir tudo isso, justamente de você?
Mas faço questão de que você nunca falte a seus compromissos na Apabex,
como participante do programa “Espaço de Convivência",
no sítio e na comunidade de residentes, localizados em Vinhedo
e em vista dos quais a palavra campo para nós se transformou em "campus",
viajando diariamente na "van", junto com seus colegas e não podendo, por isso,
escapar todos do carinhoso apelido de "bóias frias".
Não me preocupa o fato de ter que explicar a você que nem todo mundo consegue namorar, casar, dirigir automóveis, ou freqüentar faculdades, porque sempre tenho na ponta da língua exemplos de pessoas que você conhece e que não fazem nada disso.
E também não faz mal que você tenha que caminhar segurando no meu braço;
não sinto nenhum incômodo nisso, porque você é meu filho.
São muitos os momentos iluminados que juntos vivenciamos, como aquele dia em que fizemos um passeio de "teco-teco" e você me perguntou se estávamos no céu para, ante minha resposta afirmativa, manifestar o desejo de rever o seu avô, ensejando-me a ocasião de explicar-lhe que, se naquele momento isso não era possível, um dia certamente todos haveremos
de nos reencontrar, porque uns sempre precisam partir antes dos os outros.
Na verdade, considero-me um pai privilegiado, porque você nunca deixou de demonstrar que também me ama, derramando-se em carinhos de atenções e saudades, sempre que nos reencontramos,
mesmo que tenha sido breve a ausência.
Você me enseja a oportunidade preciosa de enxergar a vida
com os olhos da sensibilidade, da aceitação, do amor, da paciência, do perdão,
da renúncia e da esperança, fazendo dela um permanente exercício de aprendizado.
Neste mundo em que vivemos, não deveria existir lugar para a violência, as guerras, a exclusão, o ressentimento, a revolta, a inveja, o preconceito, o desamor e a falta de solidariedade entre as pessoas e os povos, porque estamos aqui apenas de passagem, e a jornada de cada um começa e termina no tempo de um relâmpago, como a do seu avô e de tantas outras pessoas queridas,
que já retornaram para o lugar de onde vieram.
Os desafios importantes de nossas curtas jornadas deveriam servir isto sim, para forjar sentimentos bons e corrigir trajetórias de vida, fazendo com que, no curso da caminhada, todos se ocupassem em amealhar apenas os valores do bem, exatamente aqueles capazes de acrescentar maior transcendência
 à existência de cada um.
E é exatamente isso que você me ajuda a descobrir, a todo instante.
Obrigado, filho, por ter-me feito abrir os olhos e o coração, tornando-me sensível às suas necessidades, para, a partir delas, melhor compreender as demandas dos meus semelhantes e,
na medida do possível, tentar ajudá-los a superá-las.
Obrigado por estar sendo, desde sempre, fator de equilíbrio e sustentáculo de afeto de nossa casa e nossa família, na qual experienciamos as mais variadas circunstâncias de vida,
 junto com o seu irmão, a sua mamãe, a vovó e a senhora que nos serve com dedicação.
Deus não nos teria outorgado o privilégio de protagonizarmos nossos papéis nesta vida,
se não possuíssemos perfis e condições adequadas para isso.
Tenho a certeza de que Ele confia muito em nós dois.
Portanto, meu filho, que Deus o abençoe em mais este dia dos pais.
E que o abençoando, abençoe também todos os outros filhos com deficiência,
que caminham ao lado de seus pais, por este mundo afora.
E também os filhos que já perderam seus pais.
Desejo sinceramente que você prossiga sempre feliz.
Obrigado pelos seus quarenta e cinco anos de vida, e pelo grande orgulho que me faz sentir,
quando me chama de "Papai", um privilégio reservado apenas a certos pais
numa altura dessa da caminhada ao lado de seus filhos.
Não sei por quanto tempo ainda andaremos juntos, mas obrigado, meu filho,
 por estar me transformando, a cada dia, numa pessoa um pouco melhor.

Ariovaldo Cavarzan é diretor-presidente da
Apabex - Associação de Pais Banespianos de Excepcionais
www.apabex.org.br www.facebook.com/apabex/


Formatação e Arte: Jô Abreu


  


 

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